segunda-feira, 28 de novembro de 2011

SUGESTÃO DE LEITURA PARA NÃO ESQUECER OS GOVERNOS NEOLIBERAIS, COMO OS QUE VENDERAM O BANESTADO

'Banco público impede submissão da política ao poder econômico'

Os países que preservaram instituições estatais conseguiram resistir às pressões neoliberais e priorizar desenvolvimento, geração de emprego e combate à pobreza. A maior parte está na Ásia e América Latina e é menos afetada pelas desregulamentação financeira. Nestes países, entre eles o Brasil, o Poder Político não está submetido ao Poder Econômico. No Primeiro Mundo, os sacrifícios impostos à classe trabalhadora suscitam o surgimento de uma nova esquerda.

A decisão do [então] primeiro ministro da Grécia de submeter o próximo pacote de “ajuda” da Europa ao seu país a uma consulta popular desencadeou uma queda espetacular das cotações nas bolsas de valores no mundo inteiro, colocando em foco a profunda contradição entre o Poder Político e o Poder Econômico nos países capitalistas democráticos, que hoje são a grande maioria das nações. Uma decisão que deveria ser normal em qualquer democracia – a de consultar o povo, do qual o governo, isto é, o Poder Político, é o representante – acaba de provocar pânico entre os donos do capital financeiro, que hoje detém a hegemonia do poder.

A mesma contradição é a fonte da motivação essencial do movimento hoje mundial dos Indignados, que desde 15 de outubro promove a ocupação das praças centrais dos distritos financeiros de 951 cidades em 82 países. O que os Indignados demandam, acima de tudo, é que a democracia formal, vigente nestes países, se torne real, ou seja, que o Poder Político eleito pelo povo de fato o represente, em vez de executar políticas que beneficiam exclusivamente a classe que exerce o Poder. O que evidencia a contradição de interesses entre a maioria do povo – os 99% que os ocupantes de Wall Street almejam representar – e o 1% que constitui a elite do Poder.

A contradição entre Poder Político e Poder Econômico se explica pela origem de um e outro Poder. Em democracias, o Poder Político é exercido pelos eleitos pela maioria dos cidadãos, que é necessariamente constituída por trabalhadores não proprietários de meios de produção social, boa parte dos quais ganha a vida como assalariados de empresas capitalistas; ao passo que, no capitalismo, o Poder é exercido pelos capitalistas, mas não por todos por igual.

Os empresários da economia real, isto é, cujas empresas produzem bens e serviços que atendem necessidades humanas, dependem de crédito tanto para financiar vendas a prazo quanto para investir em matérias primas, maquinário, instalações etc., na medida em que a demanda por sua produção se expande; o crédito é concedido por bancos, fundos de investimento e outros intermediários financeiros. A renda não gasta pelas famílias, empresas e governos é depositada nestes intermediários, que a redistribuem na forma de empréstimos aos governos, empresas e famílias cujos gastos superam sua renda.

Os bancos, fundos etc., que são empresas capitalistas, visam maximizar seus próprios lucros, emprestando a juros maiores do que pagam aos depositantes e aplicando parte dos depósitos que lhes são confiados em títulos de propriedade de firmas (ações) ou de débito emitidos por governos e empresas. Commodities, ações de novas empresas e cotas de fundos de investimento são transacionados em leilões diários nas bolsas de valores e suas cotações flutuam ao sabor das oscilações de oferta e demanda pelos mesmos.

A maior parte dos participantes nestes leilões são especuladores, que procuram adivinhar em que ativos irão se concentrar as preferências da maioria para adquiri-los antes que se valorizem e quais ativos serão vendidos, para vendê-los antes que se desvalorizem. Obviamente, uma parte dos especuladores faz antecipações erradas e, por isso, perde dinheiro para os seus felizes competidores, cujas apostas anteciparam o futuro corretamente.

Trata-se de um jogo de apostas, mas que afeta o andamento da economia real. Se o otimismo prevalecer nas bolsas de valores, os especuladores comprarão ações e títulos de crédito, cujas cotações subirão, o que permitirá aos empresários obter mais facilmente dinheiro para expandir suas atividades; o crescimento da produção da economia real confirmará as expectativas otimistas dos detentores do dinheiro depositado neles pelos poupadores, levando-os a reiterar as compras de títulos e assim por diante. O resultado será a formação de uma típica bolha de valorização de ativos, cujo efeito será acelerar a expansão das atividades econômicas, até que elas esbarrem em pontos de estrangulamento, que impedirão a continuação do crescimento.

Os pontos de estrangulamento são constituídos por recursos indispensáveis à produção e à distribuição, que exigem tempo para serem multiplicados, como, por exemplo, a produção e distribuição de energia elétrica, os meios de comunicação e de transporte, a mão de obra com escolaridade acima da fundamental etc.. Os pontos de estrangulamento elevam o custo de produção e distribuição de bens e serviços, suscitando círculos viciosos de elevação de preços e salários, que resultam em inflação cada vez maior, contra a qual o Poder Político é forçado a agir, reduzindo a disponibilidade de crédito e o gasto público.

O mero anúncio destas medidas de “austeridade” basta para que as expectativas dos especuladores financeiros se invertam, passando de otimistas a pessimistas, pois eles sabem que elas reduzirão a demanda por títulos nas bolsas, fazendo com que suas cotações desabem.

Inflação e renda
Em suma, o Poder Político é induzido a conter a inflação atendendo ao interesse dos capitais financeiros, que temem a desvalorização da moeda, ocasionada pela subida dos preços. A inflação exige a ampliação da oferta de moeda, que é a “mercadoria” que os intermediários financeiros transacionam. Sua desvalorização prejudica diretamente bancos e fundos, cujos capitais são constituídos, em sua maior parte, por tesouros em forma da moeda corrente do país.

Na verdade, a inflação prejudica também todos que dependem de rendas fixas, entre os quais estão também os trabalhadores informais, que estão excluídos de normas contratuais ou legais que reajustam rendas ou depósitos automaticamente por índices periódicos de inflação. Esta circunstância permite aos porta-vozes dos interesses financeiros proclamarem que é necessário paralisar o crescimento econômico tão logo pressões inflacionárias se fazem sentir, porque a inflação é o mais cruel dos impostos, pois pune os mais pobres. Na realidade, pune os mais pobres e os mais ricos, sendo óbvio que os últimos podem suportar perdas muito melhor que os primeiros.

A experiência histórica do final do século passado mostra que realmente inflação elevada e persistente pode prejudicar seriamente o funcionamento dos mercados e, quando atinge o limite da hiperinflação, tornar impossível o prosseguimento do desenvolvimento econômico; uma vez atingido este estágio, a estabilização dos preços exige o encolhimento da demanda efetiva total por bens e serviços, com efeitos negativos para a economia real, prejudicada pela dificuldade de vender com lucro suas mercadorias.

Como governo algum se arrisca a lançar a economia em hiperinflação, as fases de crescimento rápido são abortadas pelo Poder Político mediante políticas de estabilização que se caracterizam pela elevação das taxas reais de juros, proporcionando grandes lucros aos capitais financeiros.

Isso comprova mais uma vez que, no capitalismo contemporâneo, o Poder Político não pode deixar de praticar políticas, que em nome do interesse geral, de fato priorizam o capital financeiro, reforçando a hegemonia deste sobre o Poder Econômico. Convém observar que, se a intermediação financeira fosse atribuição exclusiva de bancos públicos, a estabilização dos preços em vez de concentrar a renda, como acontece hoje, reforçaria a participação do Poder Político na renda nacional, possibilitando-lhe ampliar políticas redistributivas e deste modo tornar a distribuição da renda mais justa.

Aqui reside o caráter contraditório do relacionamento entre Poder Político e Poder Econômico. Os governos desejam em geral que haja prosperidade; embora esta possa beneficiar todas as classes, o excedente econômico assim gerado sempre é apropriado pelos capitalistas. Os trabalhadores só se beneficiam pelo aumento do emprego, que viabiliza em alguma medida as campanhas sindicais por melhoras salariais. Só que estas somente são obtidas após muita luta contra a resistência patronal, ao passo que a apropriação do excedente pelos donos e administradores dos capitais é imediata: sendo as mercadorias produzidas pelos trabalhadores propriedade dos capitalistas, o lucro a mais decorrente do maior volume de vendas é deles. O que os trabalhadores podem receber a mais será pelas horas extras eventualmente trabalhadas, o que explica a forte concentração da renda que ocorre sempre quando o crescimento econômico perdura.

Para se contrapor à concentração da renda, governos comprometidos com os interesses e aspirações das classes trabalhadoras podem tributar os ganhos extraordinários dos capitalistas e aplicar a receita pública adicional em políticas redistributivas. Políticas como estas, no entanto, provocam a desconfiança dos operadores financeiros, que reduzirão suas aplicações na economia nacional, lançando-a em crise. Sabedores disso, governos de esquerda evitam ferir a confiança do capital financeiro, o que explica sua frequente conversão ao neoliberalismo.

No capitalismo contemporâneo, o Poder Econômico, ao contrário do Poder Político, deixou de ser nacional para se tornar global, sendo dominado por um limitado número de gigantescas transnacionais financeiras. Estes capitais tomam em geral a forma de bancos demasiado grandes para que os governos possam correr o risco de deixá-los quebrar. Eles estão interligados por interesses financeiros, o que lhes permite atropelar o Poder Político de países que não se submetem aos seus desejos.

O Poder Econômico privado conseguiu monopolizar a distribuição do dinheiro internacionalmente aceito, a moeda “forte”, representada principalmente pelo dólar, graças à influência que exerce sobre instituições multilaterais como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial (Bird) e a Organização Mundial do Comércio (OMC), o que lhe permite impor sua vontade ao Poder Político de nações que não têm o status de superpotências, como está claro no caso da Grécia e de mais uma série de outros países que simplesmente perderam a confiança do Poder Econômico global, de que sejam capazes de honrar suas dívidas externas. Para reconquistar esta confiança, estão sendo obrigados a aplicar políticas econômicas de austeridade que lançam suas economias nacionais em longas e profundas crises.

Bancos públicos
A voga do neoliberalismo que assolou o mundo nos últimos 32 anos fez com que muitos países vendessem seus bancos públicos a capitais privados, o que tornou seus governos inteiramente dependentes dos intermediários financeiros privados. Estes governos, para reter a confiança das finanças capitalistas, foram obrigados a equilibrar seus orçamentos, procurando reduzir seus déficits e conter o crescimento da dívida pública. Além disso, tiveram de priorizar o combate à inflação, reduzindo a despesa pública e o ritmo do crescimento econômico.

O efeito destas políticas foi reduzir a demanda por mão de obra das empresas, ampliando o desemprego, enfraquecendo os sindicatos e suas lutas por melhores salários e condições de trabalho. A contenção da despesa pública debilitou as políticas redistributivas e os sistemas públicos de saúde, educação e previdência, que estão sendo em parte privatizados.

Os países que preservaram seus bancos públicos e os ampliaram de acordo com as necessidades puderam resistir às pressões neoliberais e continuar priorizando o desenvolvimento e o combate à pobreza, ampliando e aperfeiçoando suas políticas sociais e mantendo a expansão do emprego, de modo a evitar o desemprego em massa, sobretudo o de longa duração.

Atualmente, os países que optaram por esta alternativa se encontram em sua maior parte na Ásia e na América Latina e constituem as economias emergentes que mais crescem no mundo e menos são afetadas pelas crises produzidas pela especulação financeira desregulamentada. Nestes países, entre os quais se encontra felizmente o nosso, o Poder Político não está submetido ao Poder Econômico.

Na América do Norte e na Europa o peso do legado neoliberal subordina o Poder Político à ideologia e aos interesses do Poder Econômico. Daí resulta o marasmo econômico, a persistência do desemprego em massa e da pobreza, com o aumento inegável da desigualdade socioeconômica. Nos países do Primeiro Mundo, os sacrifícios impostos à classe trabalhadora e, em especial, à juventude estão suscitando o surgimento de uma nova esquerda, que diferentemente da velha esquerda não pauta a conquista do poder como ponto de partida para a reversão de uma situação insuportável.

A rebelião dos Indignados tem por alvo a restauração da autenticidade democrática por meio da indispensável subordinação dos interesses da minoria privilegiada à vontade da maioria. Para tanto, ela terá de revelar os liames políticos e econômicos que amarram os representantes eleitos ao Poder Econômico, que retira sua força de uma globalização dominada pelo capital financeiro e que impede que o Poder Político, limitado ao âmbito nacional, possa cumprir suas plataformas eleitorais.

Obviamente, para restaurar a autenticidade democrática e a supremacia do Poder Político, será necessário desenvolver, ao lado do capitalismo, uma economia em que o capital seja propriedade coletiva dos trabalhadores que o utilizam, como sempre foi em toda longa história da humanidade que precedeu a Revolução Industrial. Esta “outra economia” já está sendo desenvolvida em numerosos países e terá como resultado a diversificação do Poder Econômico, tornando-o em boa parte afinado com as necessidades e desejos dos que hoje são explorados e alienados.

*Paul Singer é secretário nacional de Economia Solidária do ministério do Trabalho.

FONTE: CARTA MAIOR http://www.cartamaior.com.br/

domingo, 27 de novembro de 2011

PARA PENSAR A POLÍTICA EM 2012: "Democracia, poder e eleições 2012"

"Democracia, poder e eleições 2012



Eleições municipais costumam ser encaradas como um porto raso da vida democrática. Tudo se passa como se delas não dependesse a questão maior da política, que é a luta pelo poder e, sobretudo, o poder de transformar a sociedade, configurando-se a disputa local como mero entreposto de baldeação para projetos e aspirações superiores.

Ressalvadas as exceções, assim se comportam os políticos de um modo geral em relação aos cargos locais. O mesmo se dá com os partidos e seus programas. O conjunto tende a induzir o eleitor a ponto de vista de igual acanhamento. Há, é verdade, razões objetivas que alimentam essa espiral.

Muitos desafios da vida cotidiana, sobretudo na etapa de supremacia global das finanças desreguladas, não dispõem de instrumentos de reordenação local. Emprego e desemprego, por exemplo, obedecem a dinâmicas que extravasam, cada vez mais, o perímetro municipal.

Se isso é um fato, que desautoriza a ingênua postura do 'municipalismo', essa versão samba canção do modernoso equívoco que postula mudar o mundo sem tomar o poder, há que se questionar, em contrapartida, a indigência da vontade política, inclusive dos partidos de esquerda, de alterar o círculo de ferro que reproduz a dissociação entre a vida cotidiana e o poder que a determina .

Mais que nunca, a cidadania sofre e respira os ares do mundo, mas as pessoas, como dizia o geógrafo Milton Santos, vivem em seus lugares. Sintonizar a agenda dos lugares com as aspirações legítimas de seus moradores é um desafio que já não pode mais ser descartado com o velho remendo do discurso protelatório.

Nos anos 80, em Porto Alegre, a criatividade política da esquerda desbravou uma nova fronteira da democracia com a instituição do Orçamento Participativo, que justamente atacou o poder difuso dos mercados de determinar a vida cotidiana dos cidadãos. Pouco se avançou desde então nesse mesmo sentido. Muito pouco.

Administrações de direita nada mais fazem do que reiterar o caminho inverso, rifando prefeituras e orçamentos na quermesse da lógica mercadista. Como explicar que uma capital como São Paulo, por exemplo, prepare-se para mais um verão de horror, a olhar para o céu entre resignada e pânica, cada vez que ameaça chover? Como aceitar que o trânsito devastador e a ocupação imobiliária predatória e desconexa continuem a ser determinados pelos interesses especulativos e não pelo critério da qualidade de vida dos moradores?

Isso para não argüir o atual comodato tucano-kassabista sobre a incapacidade até para proceder à manutenção do que já existe --pontes e viadutos, por exemplo, que literalmente despencam de podres, embora tenham sido aprovados pela máquina pericial do alcaide. São sintomas inequívocos da anêmica fatia de poder que as autoridades locais tem se disposto a subtrair dos mercados e das elites para ceder à cidadania e às sua urgências.

A restituição ou instituição de uma quota pertinente de poder direto aos cidadãos é o requisito a partir do qual todos os demais tornam-se manejáveis. Sem isso, de fato, caminha-se para reduzir administraçoes municipais a uma simulacro de democracia, ocupadas por gerências burocráticas e ausentes da vida dis cidadãos. Com a palavra, os prefeituráveis de 2012.
Postado por Saul Leblon às 09:21"

sexta-feira, 11 de novembro de 2011

Poder permanente de derrubar governos

Poder permanente de derrubar governos
Por Maria Inês Nassif                            09/11/2011 01:59
A corrupção do sistema político merece uma reflexão para além das manchetes dos jornais tradicionais. Em especial neste momento que o país vive, quando a nova democracia completou 26 anos e a política, que é a sua base de representação, se desgasta perante a opinião pública. Este é o exato momento em que os valores democráticos devem prevalecer sobre todas as discordâncias partidárias, pois chegou no limite de uma escolha: ou diagnostica e aperfeiçoa o sistema político, ou verá sucumbi-lo perante o descrédito dos cidadãos.
O país pós-redemocratização passou por um governo que foi um fracasso no combate à inflação, um primeiro presidente eleito pelo voto direto pós-ditadura apeado do poder por denúncias de corrupção, dois governos tucanos que, com uma política antiinflacionária exitosa, conseguiram colocar o país no trilho do neoliberalismo que já havia grassado o mundo, e por fim dois governos do PT, um partido de difícil assimilação por parcela da população. Nesse período, a mídia incorporou como poder próprio o julgamento e o sentenciamento moral, numa magnitude tal que vai contra qualquer bom senso.
Este é um assunto difícil porque pode ser facilmente interpretado como uma defesa da corrupção, e não é. Ou como questionamento à liberdade de imprensa, e está longe disso. O que se deve colocar na mesa, para discussão, é até onde vai legitimidade da mídia tradicional brasileira para exercer uma função fiscalizadora que invade áreas que não lhes são próprias. Existe um limite tênue entre o exercício da liberdade de imprensa na fiscalização da política e a usurpação do poder de outras instituições da República.
Outra questão que preocupa muito é que a discussão emocional, fulanizada, mantida pelos jornais e revistas também como um recurso de marketing, têm como maior saldo manter o sistema político tal como é. É impossível uma discussão mais profunda nesses termos: a escandalização da política e a demonização de políticos trata-os como intrinsicamente corruptos, como pessoas de baixa moral que procuram na atividade política uma forma de enriquecimento privado. Ninguém se pergunta como os partidos sobrevivem mantidos por dinheiro privado e que tipo de concessão têm que fazer ao sistema.
Desde Antonio Gramsci, o pensador comunista italiano que morreu na masmorra de Mussolini, a expressão “nenhuma informação é inocente” tem pontuado os estudos sobre o papel da imprensa na formulação de sensos comuns que ganham a hegemonia na sociedade. Gramsci já usava o termo “jornalismo marrom” para designar os surtos de pânico promovidos pela mídia, de forma a ganhar a guerra da opinião pública pelo medo.
No Brasil atual, duas grandes crises de pânico foram alimentadas pela mídia tradicional brasileira no passado recente. Em 2002, nas eleições em que o PT seria vitorioso contra o candidato do governo FHC, a mídia claramente mediou a pressão dos mercados financeiros contra o candidato favorito, Luiz Inácio Lula da Silva. Tratava-se, no início, de fixar como senso comum a referência “ou José Serra [o candidato tucano] ou o caos”.
Depois, a meta era obrigar Lula e o PT ao recuo programático, garantindo assim a abertura do mercado financeiro, recém-completada, para os capitais internacionais. Em 2005, na época do chamado “mensalão”, o discurso do caos foi redirecionado para a corrupção. Politicamente, era uma chance fantástica para a oposição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva: a única alternativa para se contrapor a um líder carismático em popularidade crescente era tirar de seu partido, o PT, a bandeira da moralidade. A ofensiva da imprensa, nesse caso, não foi apenas mediadora de interesses. A mídia não apenas mediava, mas pautava a oposição e era pautada por ela, num processo de retroalimentação em que ela própria [a mídia] passou a suprir a fragilidade dos partidos oposicionistas. Ao longo desse período, tornou-se uma referência de poder político, paralelo ao instituído pelo voto.
Eleita Dilma Rousseff, a oposição institucional declinou mais ainda, num país que historicamente voto e poder caminham juntos, e ao que tudo indica a mídia assumiu com mais vigor não apenas o papel de poder político, mas de bancada paralela. Dilma está se tornando uma máquina de demitir ministros. Nas primeiras demissões, a ofensiva da mídia deu a ela um pretexto para se livrar de aliados incômodos, nas complicadas negociações a que o Poder Executivo se vê obrigado em governos de coalizão num sistema partidário como o brasileiro. Caiu, todavia, numa armadilha: ao ceder ministros, está reforçando o poder paralelo da mídia; em vez de virar refém de partidos políticos que, de fato, têm deficiências orgânicas sérias, tornou-se refém da própria mídia.
As ondas de pânico criadas em torno de casos de corrupção, desde Collor, têm servido mais a desqualificar a política do que propriamente moralizar a nossa democracia. Mais uma vez, volto à frase de Gramsci: não existe notícia inocente. O Brasil saído da ditadura já trazia, como herança, um sistema político com problemas que remontam à Colônia. O compadrio, o mandonismo e o coronelismo são a expressão clássica do que hoje se conhece por nepotismo, privatização da máquina pública e falha separação entre o público e o privado. A política tem sido constituída sobre essas bases e, depois de cada momento autoritário e a cada período de redemocratização no país, seus problemas se desnudam, soluções paliativas são dadas e a cultura fica. Por que fica? Porque é a fonte de poderes – poderes privados que podem se sobrepor ao poder público legitimamente constituído.
O sistema político é mantido por interesses privados, e é de interesse de gregos e troianos que assim permaneça. Segundo levantamento feito pela Comissão Especial da Câmara que analisa a reforma política, cerca de 360 deputados, em 513, foram eleitos porque fizeram as mais caras campanhas eleitorais de seus Estados. Com dinheiro privado. Em sã consciência, com quem eles têm compromissos? Eles apenas tiveram acesso aos instrumentos midiáticos e de marketing político cada vez mais sofisticados porque foram financiados pelo poder econômico. É o interesse privado quem define se o dinheiro doado aos candidatos e partidos é lícito ou ilícito.
O dinheiro do caixa dois passou a fazer parte desse sistema. Não existe nenhum partido, hoje, que consiga se financiar privadamente – como define a legislação brasileira – sem se envolver com o dinheiro das empresas; e são remotíssimas as chances de um político financiado pelo poder privado escapar de um caixa dois, porque normalmente é o caixa dois das empresas que está disponível. Num sistema eleitoral onde o dinheiro privado, lícito e ilícito, é o principal financiador das eleições, ocorre a primeira captura do sistema político pelo poder privado. E isso não acaba mais.
Esse é o âmago de nosso sistema político. A democratização trouxe coisas fantásticas para a política brasileira, como o voto do analfabeto, a ampla liberdade de organização partidária e a garantia do voto. Mas falhou no aperfeiçoamento de um sistema que obrigatoriamente teria de ser revisto, no momento em que o poder do voto foi restabelecido pela Constituição de 1988.
Num sistema como esse, por qualquer lado que se mexa é possível desenrolar histórias da promiscuidade entre o poder público e o dinheiro privado. Por que isso não entra, pelo menos, em discussão? Acredito que a situação permaneça porque, ao fim e ao cabo, ela mantém o poder político sob o permanente poder de chantagem privado. De um lado, os financiadores de campanhas se apoderam de parcela de poder. De outro, um sistema imperfeito torna facilmente capturável o poder do voto também por aparelhos privados de ideologia, como a mídia. Como nenhuma notícia é inocente, a própria pauta leva a relações particulares entre políticos e o poder econômico, ou entre a máquina pública e o partido político. A guerra permanente entre um governo eleito que tem a oposição de uma mídia dominante é alimentada pelo sistema.
O apoderamento da imprensa é ainda maior. Se, de um lado, a pauta expressa seu imenso poder sobre a política brasileira, ela não cumpre o papel de apontar soluções para o problema. Não existe intenção de melhorá-lo, de atacar as verdadeiras causas da corrupção. Apesar da imensa caça às bruxas movida pela mídia contra os governos, em nenhum momento essa sucessão de escândalos, reais ou não, incluíram seriamente a opinião pública num debate sobre a razão pela qual um sistema inteiro é apropriado pelo poder privado, inclusive e principalmente porque não se questiona o direito de apropriação do poder público pelo poder privado. A mídia tradicional não fez um debate sério sobre financiamento de campanha; não dá a importância devida à lei do colarinho branco; colocou a CPMF, que poderia ser um importante instrumento contra o dinheiro ilícito que inclusive financia campanhas eleitorais, no rol da campanha contra uma pretensa carga insuportável de impostos que o brasileiro paga.
Pode fazer isso por superficialidade no trato das informações, por falta de entendimento das causas da corrupção – mas qualquer boa intenção que porventura exista é anulada pelo fato de que é este o sistema que permite à imprensa capturar, para ela, parte do poder de instituições democráticas devidamente constituídas para isso.
(*) Texto apresentado no Seminário Internacional sobre a Corrupção, dia 7 de novembro de 2011, em Porto Alegre.

quinta-feira, 10 de novembro de 2011

BERLUSCONI CAIU. A DIREITA CHORA!

BERLUSCONI CAIU. A DIREITA CHORA!
Por Altamiro Borges
Em entrevista nesta terça-feira (8), o presidente italiano Giorgio Napolitano informou que o premiê Silvio Berlusconi renunciará já na próxima semana, após a votação final do “pacote de austeridade” do seu governo ultraconservador. O anúncio foi feito logo após o bravateiro fascistóide perder a maioria numa importante votação do parlamento da Itália.

A queda de Berlusconi representa um duro golpe na direita italiana e pode ter reflexos na Europa. Juntamente com Angela Merkel (Alemanha) e Nicolas Sarkozy (França), o primeiro-ministro italiano liderou a guinada neoliberal no velho continente, acelerando o desmonte do estado de bem-estar social e reforçando os laços de servilismo com os EUA nas suas políticas imperialistas.

Expressão grotesca do poder midiático

Silvio Berlusconi é a expressão grotesca do poder midiático na atualidade. Dono de um império de comunicação, ele foi eleito três vezes primeiro-ministro da Itália (1994-1995, 2001-2006, 2008-2011). Durante este longo período, ele sofreu 17 processos na Justiça por desvio de recursos públicos, fraude fiscal, suborno, evasão de divisas e escândalos sexuais – inclusive pedofilia.

A blindagem da mídia, tão seletiva na Itália como no Brasil, garantiu a sobrevivência política e as vitórias eleitorais de Berlusconi. O patético ricaço – a revista Forbes o classificou como a segunda pessoa mais rica da Itália e o 74º homem mais rico da Europa, com fortuna estimada em US$ 9 bilhões – sempre foi funcional para a avarenta burguesia italiana. Por isso, ele durou tanto tempo.

Crise econômica e auditoria do FMI

A grave crise que atinge a Itália, porém, precipitou seu fim. Na semana passada, durante a reunião do G20, a Itália anunciou que submeterá suas contas à auditoria do Fundo Monetário Internacional (FMI). A decisão, que confirma o caos econômico do país, apavorou os banqueiros. Há forte risco de calote da dívida italiana, o que pode afundar de vez a combalida Europa.

O agravamento da crise minou a base de apoio de Berlusconi. Na votação do seu “plano de austeridade”, ele perdeu a maioria dos 316 deputados. Seu principal aliado, o líder fascista Umberto Bossi, pediu sua renúncia, seguido por deputados do seu próprio partido, Povo da Liberdade (PL). Berlusconi rotulou os dissidentes de “traidores”, mas ficou sem condições para permanecer no cargo.

Queda de popularidade e protestos de rua

Fora dos círculos do poder, o premiê estava ainda mais desgastado. Pesquisa da semana passada confirma que a popularidade de Berlusconi caiu a seu nível histórico mais baixo, de 22%. Em janeiro, metade dos italianos já defendia sua imediata renúncia. Greves gerais e protestos de rua exigem a sua queda desde o final do ano passado.

Os escândalos sexuais de Berlusconi, de 75 anos, só aumentaram o seu desgaste. Em outubro, um extrato bancário provou que ele gastou 2,7 milhões de euros (R$ 6,5 milhões) com presentes para garotas de programa. A marroquina Karima el-Mahroug, conhecida como Ruby Rubacuore (“rouba corações”), confessou que participou de festas na mansão do ricaço quando menor de idade e que recebeu 7 mil euros. Em maio, ela foi presa por roubo e foi imediatamente libertada após uma ligação do “amigo” poderoso.

“Vou embora deste país de merda”

Berlusconi já sabia que estava com os dias contados. Só durou mais algum tempo para fazer o último trabalho sujo da asquerosa burguesia italiana, com a aprovação do “plano de austeridade”. Em setembro, numa gravação telefônica que vazou, o arrogante premiê afirmou: “Em alguns meses me vou. Vou embora deste país de merda, do qual estou nauseado”.

Se houvesse justiça, ele deveria ir era para a cadeia. Alguns “calunistas” da mídia brasileira, que tanto o bajularam o líder direitista, poderiam lhe fazer visitas. Diogo Mainardi até mora na Itália!
Texto: / Postado em 09/11/2011 ás 09:40 em:
 

terça-feira, 8 de novembro de 2011

PARA LER E SABER..."Sociedade quer lisura no trato do dinheiro público e tem apoio do PT e de seus governos"

Sociedade quer lisura no trato do dinheiro público e tem apoio do PT e de seus governos

O tema da corrupção é vastíssimo. Aqui trato da ofensiva midiática e da política de nossos governos de combate à corrupção. A mídia e a oposição têm insistido no tema corrupção, desde que se iniciou o projeto político progressista e de esquerda em 2003, com o claro objetivo de desestabilizá-lo. Isso teve seu ponto alto em 2005, quando estava presente a intenção golpista, insistamos, tanto da oposição quanto das nossas oligarquias midiáticas.

É bom valer-se do passado para iluminar o presente. Essas campanhas, assemelhadas às atuais, sempre foram dirigidas pela direita. Voltemos a 1954, quando se tentava caracterizar um “mar de lama” no Palácio do Catete, patrocinado por Getulio Vargas, que redundou no suicídio do presidente, numa impressionante revolta popular e na derrota do golpe em andamento. Naquela campanha, a UDN era seu braço político, e seu representante mais destacado, Carlos Lacerda, o Corvo.

Outra campanha contra a corrupção foi aquela que derrubou Goulart, em 1964. Lutava-se contra a “república sindical”, contra os comunistas, e também contra a corrupção. Mídia e oposição não enxergavam a  montanha de dólares que inundaram o Brasil para financiar as atividades golpistas desde que Goulart assumiu, em substituição a Jânio Quadros, este, aliás, um político que fez a campanha na linha da faxina moralista, termo  recuperado pela direita e pela mídia. Mas se esquecem de que a história não se repete.

A campanha midiática atual, que perde fôlego por sua inconsistência, tem características não tão incomuns. Guarda semelhança com as passadas. Desenvolve-se a partir da mídia – não constitui uma iniciativa da oposição. Esta, apenas cavalga a mídia, a galope. A mídia tenta incensar a presidenta Dilma, ao indicar uma suposta leniência do ex-presidente e um rigor higiênico da presidenta. Insiste na faxina, e quando a presidenta afirma que a faxina é contra a miséria diz que ela recuou, tentando acuá-la ou seduzi-la.

Concentra suas baterias em indivíduos, e não lhe importa se há verdade ou não no que afirma. Tanto que, depois que ministros saem, deixa-os de lado, não importa mais saber o que efetivamente ocorreu. O objetivo é político – e sempre que algum ministro saía, dizia que ele fazia parte da herança maldita do ex-presidente Lula. Dilma desmontou tudo isso na abertura do 4º Congresso do PT, ao dizer-se parte íntima e dirigente do governo Lula, como é óbvio, embora o óbvio nem sempre interesse à velha mídia.

Quando se diz que o objetivo é político, assusta. Afinal, jornalismo não deveria ter objetivos políticos, segundo alguns manuais. Mas tem. Na campanha eleitoral, a então presidente da Associação Nacional de Jornais, Judith Brito, afirmou que era a imprensa que devia indicar os caminhos à oposição. Declarou-se como partido político. É assim que atua uma parte substancial de nossa mídia, a mesma que contribuiu para a tentativa de golpe contra Vargas, participou das articulações do golpe de 1964, foi conivente com a ditadura, apoiou Collor, sustentou os tucanos no poder. A mídia no Brasil tem lado, tem projeto político. E esse jornalismo de campanha que faz não é inocente, não integra nenhum ideal a favor de uma sociedade transparente.

A campanha em andamento tem outra característica central: a corrupção parece ter apenas um lado – os corruptos. Não aparecem os corruptores. É uma campanha que parece almejar uma sociedade de virtuosos. O aparelho de Estado deveria ser o ambiente da virtude, e tudo estaria resolvido. Além disso, a campanha quer valorizar a capacidade técnica, e eliminar a política, como se isso fosse possível. Tudo que vem da política é criminoso, quase pecaminoso. As nomeações dos cargos em comissão são transformadas em crimes. É como se as pessoas porventura nomeadas, em princípio, fossem suspeitas e não tivessem, necessariamente, nenhuma capacidade técnica. É como se a técnica, então, devesse governar, sem a intromissão da política.

E a mídia arrumou uma pobre simbologia para secundar o termo faxina, a vassoura. Havia um quê de udenista, do mais atrasado moralismo, uma lembrança melancólica do janismo naquela imagem exposta sobre as areias de Copacabana, pretendendo simbolizar os 513 deputados. Trata-se de demonizar a política. Parlamentares são os culpados pela corrupção, é o veredito. Claro que a absolvição de Jaqueline Roriz, para falar de um acontecimento recente, é um triste episódio, mas satanizar a política é sempre um flerte com o autoritarismo, que, felizmente, não tem condições de retornar.

Curioso que essa campanha seja ecoada por figuras cujo histórico não revela nenhum compromisso com a lisura da coisa pública. Há alguns que guardam profundo parentesco com oligarquias historicamente corruptas, e acostumadas a repelir quaisquer tentativas de transparência na vida pública. Temos de separar as coisas. A atitude sincera de parte de nossa população, que clama corretamente por uma cada vez maior lisura no trato do dinheiro público, tem nosso mais entusiasmado apoio – do meu partido, o PT, e do governo Dilma, como teve dos governos Lula.

Outra coisa é o samba de uma nota só da oposição, que revela, de um lado, sua vocação udenista tardia e, de outro, sua impressionante indigência política, uma incapacidade de pensar o Brasil, de apresentar um projeto alternativo ao país. A oposição não consegue pensar em outra coisa senão na corrupção, e ao falar remete-se a números e informações que o governo disponibiliza porque não esconde nada, apura tudo, e combate cotidianamente a corrupção.

Temos um projeto político para a Nação, e o executamos com rigor e firmeza. Estamos mudando o Brasil e as condições de vida para muito melhor. Os objetivos de nosso projeto são distribuir renda, promover a justiça social, crescer economicamente para superar as profundas desigualdades. A ética da política é concentrada no cumprimento dessas tarefas. E, ao mesmo tempo, como obrigação essencial, desenvolvemos um sistemático combate à corrupção.

O fenômeno da corrupção

O fenômeno da corrupção não é um problema apenas brasileiro. Afeta todos os países e, indistintamente, entidades públicas e privadas, comprometendo as políticas públicas e o desenvolvimento econômico e social, em todas as nações.

Por isso, o debate sobre se prevenir contra a corrupção e combatê-la tem-se ampliado, mobilizando, nos últimos anos, governos e sociedades pelo mundo afora. Exemplos disso são os acordos e tratados internacionais cujo objetivo é enfrentar esse mal. E o Brasil é signatário de três dessas convenções: a da Organização das Nações Unidas (ONU), a da Organização dos Estados Americanos (OEA) e a da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).

Mais que em quaisquer outros governos anteriores, o governo Lula combateu, e a presidenta Dilma vem combatendo, cotidianamente a corrupção no país, com coragem e determinação, promovendo o controle do uso dos recursos públicos, a integridade institucional e a ética na administração. Destaco, de modo especial, o trabalho sério desenvolvido pela Controladoria-Geral da União, órgão central do Sistema de Controle Interno do Poder Executivo Federal, que se expandiu, se consolidou sob o governo Lula.

A corrupção na política e na administração pública no Brasil sempre existiu. O elemento novo é que agora está sendo investigada (e revelada) de modo sistemático e eficaz. Por essa razão, há uma maior percepção do problema pela sociedade. Isso é essencial entender para combater a campanha midiática, que às vezes faz crer que a corrupção surgiu ontem e, sob o pretexto do jornalismo, não quer fazer outra coisa senão combater o governo.

Aumento do combate à corrupção

O povo brasileiro já percebe hoje que, nos últimos oito anos e meio, o que tem aumentado é o combate à corrupção, e não ela própria. E isso ocorre por força das inúmeras ações de fiscalização, investigação e enfrentamento da corrupção, que tiveram início no governo Lula e prosseguem agora com Dilma, suscitando seu debate público em níveis sem precedentes.

Desde 2003, o governo Lula adotou a decisão política de investir no fortalecimento dos órgãos de controle e de investigação, tais como CGU, Polícia Federal e Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf). Concretamente, traduziu-se no incremento substancial do número de policiais e auditores, na recomposição salarial dessas categorias, no reequipamento desses órgãos e, mais importante, em sua absoluta independência de atuação.

Tomou também a decisão política de abrir as portas e as informações do Poder Executivo ao amplo escrutínio do Ministério Público, de modo a que este pudesse melhor cumprir sua função constitucional, bem ao contrário do que ocorria antes. Lembro aqui o procedimento do procurador-geral à época de FHC, que ficou conhecido como engavetador-geral da República. E permaneceu oito anos no cargo. Com Lula e Dilma, os procuradores-gerais foram, sempre, os indicados pelo voto da categoria e deram todas as mostras de sua total autonomia, como o país testemunha.

A imprensa jamais teve tamanha liberdade de acesso às informações sobre as investigações e sobre a execução dos gastos públicos, em decorrência do aumento cada vez maior da transparência. Assistindo a uma reportagem sobre a presença da presidenta Dilma na ONU, vi uma jornalista da Rede Globo admitir que, de fato, a transparência no governo hoje é muito grande, e todo mundo sabe que isso vem desde o governo Lula. Só que uma declaração dessas aparece assim, de raspão, e não como notícia de que, sob os nossos governos, a corrupção tem outro tratamento, rigoroso, e a transparência das contas públicas nunca tão foi evidente.

E houve uma radical mudança nos organismos de controle do Estado, que passaram a atuar de forma integrada e articulada, embora cada um no seu papel: CGU, PF, Ministério Público, Tribunal de Contas da União, Coaf, Receita Federal, entre outros.

É claro que as instituições não se transformam nem se purificam da noite para o dia. As velhas práticas não são erradicadas apenas pela vontade de mudar. Trata-se de um processo. O importante é que foi no governo Lula que se deu início à transformação e ela está em marcha.

Os dois mandatos do presidente Lula e o da presidenta Dilma têm o que mostrar quando se trata de medidas de repressão à corrupção. Até julho último, já perderam o cargo efetivo 3.297 servidores federais, perto de 300 deles dirigentes e superintendentes de estatais, secretários e subsecretários de ministérios, altos assessores, procuradores e fiscais da Receita, gerentes e coordenadores de setores da administração. As expulsões ocorrem, sempre, após instauração de processo administrativo, na forma da lei, antecedido do devido contraditório e ampla defesa.

Para viabilizar toda essa ação, o governo criou, inicialmente, o Sistema de Corregedoria da Administração Federal, com uma corregedoria em cada ministério e a coordenação central na CGU. A seguir, lançou o Programa de Capacitação em Processo Disciplinar, que já alcançou mais de mil servidores nos diversos órgãos, no país inteiro, de modo a que os gestores não deixem de instaurar os processos que se recomendam sob a alegação de falta de pessoal qualificado, como se fazia no passado. O governo não fica à espera da punição judicial, cuja morosidade é conhecida. Aplica as sanções legais, amparado sempre na lei, e contribui para a reversão da impunidade.

Implantou também o mecanismo das sindicâncias patrimoniais, para a verificação de enriquecimento ilícito por parte de agentes públicos. Das centenas de investigações, mais de uma centena de sindicâncias patrimoniais já foram instauradas de 2005 para cá.

O governo não se preocupou apenas com as infrações dos agentes públicos. A corrupção envolve, no mínimo, um corrupto e um corruptor, e é preciso agir nos dois lados. A lei, então, passou a ser aplicada também contra as empresas corruptoras. Várias delas – construtoras, fornecedoras de ambulâncias, de equipamentos médicos e de mão de obra – já foram declaradas inidôneas, e com isso proibidas de contratar com a administração pública. E, para evitar que as empresas inidôneas sejam contratadas por outros entes federativos, a CGU criou o Cadastro Nacional de Empresas Inidôneas e Suspensas, no qual se revelam as punições aplicadas por estados, pelo TCU e por quaisquer outros órgãos que queiram integrar-se ao cadastro.

Tem havido, ainda, o que o governo chama de articulação para a efetividade. A CGU e a PF atuam juntas em operações especiais. De 2004 até agosto último, a PF realizou mais de 1.500 operações, como Gafanhoto, Mamoré, Guabiru, Confraria, Campus Limpo, Sanguessuga, Vampiros, Navalha. Foram presas quase 17 mil pessoas, entre as quais, além de empresários, mais de 2 mil agentes públicos dos mais variados níveis hierárquicos – juízes, parlamentares, procuradores, policiais, entre outros.

Buscando sempre a articulação com os demais órgãos de defesa e controle do Estado, a CGU instituiu o procedimento de envio sistemático dos resultados de suas auditorias e dos seus processos disciplinares ao MP para adoção de medidas judiciais. A CGU também se articula intensa e crescentemente com a Advocacia-Geral da União (AGU), apresentando resultados positivos. Prova disso são as centenas de ações de improbidade ajuizadas anualmente pela AGU com fundamento nos trabalhos da CGU.

Da mesma forma, com o Tribunal de Contas da União. Além da articulação formal, que decorre das normas constitucionais, avançou-se muito – respeitadas as diferenças da função e do papel de cada um – para o compartilhamento de informações, o intercâmbio de conhecimento técnico e a integração de sistemas.
De 2003 para cá, mais de 12 mil Tomadas de Contas Especiais (TCE) foram instauradas pelos ministérios e entidades federais, examinadas pela CGU e encaminhadas ao TCU, envolvendo o retorno potencial da ordem de R$ 6,8 bilhões aos cofres públicos. A TCE é um instrumento de que dispõe a administração pública para ressarcir-se de prejuízos que lhe forem causados. Objetiva, especificamente, quantificar os prejuízos e identificar os responsáveis, para efeito de ressarcimento.

Nunca antes na história desse país houve colaboração e parceria entre os órgãos do Executivo e o Ministério Público, nunca a PF havia prendido tantas pessoas envolvidas em corrupção. Em governos anteriores, nunca tantos servidores e dirigentes públicos acusados de irregularidades responderam a processos administrativos que resultassem na demissão dos cargos efetivos. Não havia programas de capacitação para levar os inquéritos à frente e aplicar as punições, e muito menos sindicâncias que investigassem o crescimento do patrimônio de agentes públicos incompatível com a renda.

Prevenção, transparência e participação cidadã

Além das medidas repressivas, os governos Lula e Dilma investiram em políticas públicas de transparência e prevenção da corrupção. No mundo inteiro se reconhece que as ações repressivas, sozinhas, não são capazes de resolver o problema. Na área da prevenção, o Brasil tem avançado de modo inédito em todas as linhas recomendadas nas convenções de que é signatário.

Partindo de uma situação de visível atraso nesse campo, já que em 2003 a transparência por aqui era praticamente nenhuma, o Brasil se transformou, nesse período, em referência internacional, em modelo que vem sendo copiado por outros países.

A CGU lançou, em 2004, o Portal da Transparência1, que é dos mais completos sites existentes no mundo em seu gênero. O objetivo é dar visibilidade, na internet, às despesas do governo, com todos os detalhes de cada programa, de cada verba e de cada beneficiário, acessível a qualquer cidadão, sem necessidade de senha nem cadastro. E, mais importante ainda, em linguagem cidadã, isto é, inteligível pelo cidadão comum. A medida foi posta em prática quando a CGU era dirigida por Waldir Pires, exemplo de homem público comprometido com as melhores causas do povo brasileiro, e continua até hoje, sob a direção do ministro Jorge Hage.

Esse importante instrumento de controle social abriga cerca de 1,2 milhão de unidades de informações, envolvendo a aplicação de recursos orçamentários superiores a R$ 8,5 trilhões, no período de 2004 a 2009. E, do ano passado para cá, as despesas do governo são lançadas diariamente no portal. Assim, tudo, absolutamente tudo o que se empenhou ou liquidou hoje estará exposto no portal amanhã. Nunca antes na história do mundo aconteceu algo semelhante.

A iniciativa tem sido motivo de sucessivos convites ao Brasil para apresentá-la em países os mais diversos e em eventos da ONU e da OCDE, ocorridos desde Nova York até Astana, no Cazaquistão, passando por Lima, Viena, Bruxelas, Doha, entre outras capitais. O portal já recebeu diversas premiações – da ONU, por exemplo, como uma das cinco melhores práticas de prevenção e combate à corrupção ao redor do mundo. O Brasil, sob os governos de Lula e Dilma, reiteremos, constitui exemplo para o mundo quando se trata de transparência da coisa pública e combate à corrupção.

No âmbito interno, a experiência da CGU vem sendo disseminada em vários estados. Alagoas, Bahia, Ceará, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso, Pará, Paraná, Pernambuco, Rio Grande do Norte e Rio Grande do Sul2 já contam com seus portais de transparência, nos moldes do federal. Cito ainda, como exemplo notável, o município de Vitória da Conquista, terceira maior cidade da Bahia, onde o prefeito Guilherme Menezes (PT) instituiu a Secretaria da Transparência, também nos moldes da CGU.

Embora ainda haja muito a fazer, a situação de hoje é absurdamente diferente do que era há menos de uma década. Na Bahia, há poucos anos, nem sequer os representantes do povo, na Assembleia Legislativa, tinham direito à senha do Tesouro, para acompanhar os gastos públicos estaduais. A Bahia era então comandada por uma oligarquia que abominava a transparência na coisa pública. Lembro-me das lutas de que participava, como militante ou parlamentar, contra a corrupção da oligarquia baiana e pela abertura das contas. E a família oligárquica fazia ouvidos de mercador. Hoje, sob o governo Wagner, qualquer cidadão tem o direito de acessar as contas públicas.

Nosso governo disponibilizou dois portais, hospedados no Portal da Transparência, com dados e informações sobre a Copa do Mundo de 20143 e os Jogos Olímpicos e Paraolímpicos de 20164. A sociedade pode acompanhar as ações do governo federal para a realização desses eventos.

Em 2004, o governo criou, na CGU, o Conselho de Transparência Pública e Combate à Corrupção, que visa trazer a sociedade civil para, junto com órgãos públicos, discutir e sugerir o aperfeiçoamento do sistema. O conselho tem vinte integrantes e é composto paritariamente por representantes do governo e de entidades da sociedade civil, entre as quais a OAB, a ABI, a ONG Transparência Brasil e entidades das classes produtoras e dos trabalhadores.

Em parceria com a Secretaria-Geral da Presidência, a CGU prepara a 1ª Conferência Nacional sobre Transparência e Controle Social, a se realizar em maio do próximo ano, para intensificar ainda mais a transparência pública e estimular a participação da sociedade. É uma experiência inédita, acompanhando uma política geral de fortalecimento da participação direta do nosso povo na vida pública.

O governo compreende que a transparência não é um fim em si mesmo. Deve ser utilizada pela população para o efetivo acompanhamento da gestão pública, e é preciso que a sociedade seja estimulada a assumir esse papel. E, como muitas vezes as pessoas não sabem por onde começar, a CGU criou o Programa Olho Vivo no Dinheiro Público5, que oferece oportunidade para o cidadão aprender como acompanhar a aplicação desse dinheiro. Inclui a realização de seminários em municípios-sede de microrregiões, com distribuição de cartilhas para conscientização e orientação de lideranças locais na fiscalização da administração pública.

Mais de 30 mil cidadãos, entre professores e estudantes da rede pública, lideranças comunitárias, agentes públicos municipais e integrantes de conselhos municipais já participaram de encontros presenciais e cursos a distância em 1.200 municípios. Dois milhões de exemplares da cartilha Olho Vivo já foram distribuídos. O programa foi contemplado com o Prêmio Educare (Prêmio Nacional de Excelência na Educação), edição 2007.

A CGU tem investido fortemente também na educação de crianças e jovens para a ética e cidadania, visando contribuir para a formação de uma consciência cidadã. Entre as ações desenvolvidas estão O Concurso de Desenho e Redação, criado em 2007 e realizado anualmente; o Portalzinho Criança Cidadã, com jogos, histórias em quadrinhos com mensagens sobre ética e cidadania; e o Projeto Um por todos e todos por um! Pela Ética e Cidadania, criado em parceria com o Instituto Maurício de Sousa. O projeto conta, assim, com a ajuda especial da Turma da Mônica para desenvolver nas crianças conceitos e valores fundamentais para a formação de uma cultura ética. Os projetos da CGU voltados à promoção da ética e da cidadania para juventude já mobilizaram cerca de 800 mil crianças e jovens, 24.500 mil professores e 5.500 escolas.

Esforços legais

Além disso, o Decreto nº 6.170, de julho de 2007, elaborado pelo Ministério do Planejamento e pela CGU, deu nova regulamentação às transferências de recursos federais para estados, municípios e entidades privadas sem fins lucrativos (ONGs). Implicou na criação do Portal dos Convênios, gerido por um comitê integrado por CGU, Ministério do Planejamento e Secretaria do Tesouro Nacional e que, embora ainda passe por aprimoramentos, em razão de sua amplitude e complexidade, vai possibilitar mecanismos modernos de acompanhamento pela sociedade, pelos parlamentares e pela mídia.

Seguindo as convenções internacionais contra a corrupção, o governo enviou ao Congresso, em 2006, projeto de lei (PL) sobre conflitos de interesse, que altera regras existentes, amplia os cargos abrangidos e modifica as penalidades e a política de remuneração para ex-ocupantes de cargos públicos. Aumenta, por exemplo, a chamada “quarentena” de quatro meses para um ano, a contar da data da exoneração ou aposentadoria. Durante esse período, os ex-ocupantes de cargos, especialmente os que trabalharam com informações estratégicas para o mercado, ficam impedidos de prestar qualquer tipo de serviço a pessoa física ou jurídica com quem tenham estabelecido relacionamento em razão de suas atribuições.

Também tramita no Legislativo, desde 2005, outro PL enviado pelo governo, que resgata compromisso assumido na Convenção Interamericana contra a Corrupção, em 1996. Torna crime, no Código Penal, o enriquecimento de qualquer agente público que não possa ser explicado com os rendimentos declarados.

Em maio de 2009, encaminhou ainda um PL que trata do acesso à informação, uma antiga reivindicação de entidades da sociedade civil brasileira, além de constituir recomendação das convenções internacionais. Aprimorado e aprovado na Câmara, onde se derrubou o “sigilo eterno” sobre determinados documentos, encontra-se, no momento em que escrevo este texto, em discussão no Senado.

No final de 2009, durante comemoração do Dia Internacional contra a Corrupção, o então presidente Lula enviou ao Congresso um PL que torna mais rigorosas as punições por crimes de corrupção quando praticados por autoridades dos primeiros escalões dos três Poderes da República, nos três níveis da administração pública: federal, estadual e municipal.

Nessa mesma linha, a CGU e o Ministério da Justiça elaboraram e o então presidente Lula encaminhou ao Congresso, em janeiro de 2010, um PL sobre Responsabilidade Civil e Administrativa de Pessoa Jurídica, que propõe novas formas de punição para empresas envolvidas em corrupção, como fraude em licitações, pagamento de propina a servidor público ou maquiagem de serviços e produtos fornecidos ao governo. Prevê, por exemplo, multa (de 1% a 30% do faturamento bruto), impedimento de receber benefícios fiscais, fechamento temporário ou mesmo extinção, dependendo da gravidade do ilícito praticado. Com isso, o combate à corrupção alcança corruptos e corruptores.

O grau de transparência dos gastos públicos era quase zero até 2002. Não havia nenhuma iniciativa do governo para estimular o controle social. Tampouco preocupação em dar cumprimento às convenções internacionais contra a corrupção ou em se somar ao esforço mundial de enfrentamento desse mal em todas as suas vertentes. Tudo mudou, como se vê, sob os governos do presidente Lula e, agora, da presidenta Dilma. O Legislativo tem a oportunidade, face a tantos projetos na Câmara e no Senado, de dar sua contribuição no combate à corrupção.

Inovações no controle interno

A CGU estabeleceu o Programa de Fiscalização por Sorteios, em 2003, medida extremamente inovadora de fiscalização dos recursos federais repassados aos municípios para execução de ações locais, em educação, saúde, assistência social, habitação, entre outros setores. De modo a garantir absoluta isenção e impessoalidade na escolha da amostra a ser fiscalizada a cada vez, optou-se por um inédito sistema de sorteios públicos, feitos abertamente no auditório da Caixa Econômica Federal, usando a mesma estrutura das loterias e outros sorteios conhecidos da população. O programa já permitiu a verificação in loco da aplicação dos recursos federais, cerca de R$ 16 bilhões, em mais de 1,8 mil municípios, descobrindo e revelando uma variada tipologia de desvios.

De forma também inédita, a CGU estabeleceu as auditorias investigativas e operações especiais, passando a atuar tanto em ações individuais de sua auditoria como em parceria com a PF. Entre as de caráter investigativo da CGU, merecem destaque, por sua amplitude sem precedentes, as que foram feitas na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, em 2005; em Furnas S.A., em 2006; na Infraero, em 2007; no governo do Distrito Federal, no final de 2009. E agora, a partir de denúncias feitas pela mídia, nos Ministérios dos Transportes, da Agricultura e do Turismo.

Todo esse trabalho, desenvolvido nas mais diversas frentes, permite afirmar, hoje, que o governo brasileiro não se encontra mais nem na acomodação da tolerância, nem na mera lamentação dos males causados pela corrupção. Esses esforços já são reconhecidos internacionalmente por autoridades públicas e especialistas que se dedicam ao enfrentamento do problema.

A segurança de que o Brasil está no caminho certo nos é também assegurada pelo órgão especializado da ONU, o UNODC, com o qual a CGU mantém acordo de cooperação técnica. O professor Stuart Gilman, uma das maiores autoridades do mundo no tema anticorrupção, tem afirmado repetidas vezes, de público, que considera a CGU centro de excelência e referência para outros países.

Não por acaso o Brasil foi classificado em oitavo lugar em um ranking de 85 países que tiveram o grau de transparência do orçamento público analisado pelo International Budget Partnership (IBP), uma ONG com sede em Washington. Nesse ranking, somos o país mais bem posicionado da América Latina.

Mas o mais importante reconhecimento é o do povo, do cidadão comum. É aquele que foi captado por pesquisa nacional realizada em meados de 2009 pela UFMG, com o Instituto Vox Populi. Os resultados revelaram que 75% dos brasileiros sabem que nos últimos cinco anos, no governo federal, “o que cresceu não foi a corrupção, mas sim a apuração dos casos de corrupção, que antes ficavam escondidos”.

Todo esse progresso, todos esses inegáveis avanços não autorizam, no entanto, que nos demos por satisfeitos. A guerra contra a corrupção não tem fim nem permite tréguas. É uma guerra permanente, cotidiana.

Muitos são ainda os desafios a ser enfrentados para que o país possa avançar como um todo, de forma mais homogênea, na luta anticorrupção. Com a grande autonomia de cada um dos entes da federação, o muito que vem sendo feito na esfera federal precisa encontrar eco nos estados e municípios.

Ninguém desconhece também que as causas mais profundas da corrupção têm raízes em questões mais amplas, como o financiamento privado de campanhas e de partidos, o sistema eleitoral, os meandros da elaboração do orçamento público, a urgente necessidade de reforma radical da burocracia estatal e das leis processuais penais, que são, hoje, a principal garantia de impunidade e grandes obstáculos no combate à corrupção.

Mas sabemos, igualmente, que tais reformas exigem um nível de consenso entre as forças políticas nacionais que nosso país ainda não alcançou. E, quem sabe, reclame uma intensa pressão popular para que venham a ocorrer.

Então, a pergunta é: enquanto não se atinge esse consenso, não há o que fazer? Claro que há. E foi nos limites dessas condições institucionais e políticas que os governos Lula, e agora o governo Dilma, conseguiram fazer tudo o que foi aqui assinalado.

Com essa diretriz, o Brasil está implantando todo o elenco de medidas preventivas recomendadas internacionalmente e, ao mesmo tempo, reforçando a repressão e a punição exemplares. Tudo isso mostra, também, a importância da continuidade desse esforço. Não pode haver retrocesso nem recuo nessa caminhada, que sabemos longa e difícil. E essa luta vai continuar.

Emiliano José é jornalista, escritor, deputado federal (PT-BA), TEORIA E DEBATE, http://www.teoriaedebate.org.br/materias/politica/o-combate-corrupcao-nos-governos-lula-e-dilma?page=full .

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Um míssil contra a corrupção - Por Henrique Fontana

Um míssil contra a corrupção
Entrevista – CARTA CAPITAL, http://www.cartacapital.com.br/blog/politica/um-missil-contra-a-corrupcao-2/
05.11.2011 08:55

Por duas vezes o deputado federal Henrique Fontana conseguiu adiar a votação de seu relatório sobre a reforma política ao antever prováveis derrotas. A maior resistência ao texto concentra-se na proposta de financiamento público exclusivo das campanhas eleitorais, uma ideia que tem unanimidade no PT, mas é rejeitada por quatro grandes legendas no Congresso: PMDB, PSDB, DEM e PP. E pior: mal compreendida e pouco debatida, encontra forte resistência na opinião pública. Fontana não desiste. Pretende levar o relatório à votação na quarta-feira 9, apesar de o risco de reprovação continuar o mesmo de antes. “O sistema de financiamento privado traz enorme prejuízo à democracia. Entre outros pontos, por dar enorme poder aos financiadores.” Segundo o parlamentar, o modelo atual pavimenta os caminhos da corrupção e afasta da política cidadãos com boas ideias e ideais.
Leia mais:
CartaCapital: Alimenta-se no Brasil a tese de que o sistema político brasileiro é imprestável e precisa ser totalmente reformado. É isso mesmo?
Henrique Fontana: Não, mas acredito que algumas mudanças estruturais seriam decisivas para consolidar a democracia. O voto proporcional, por exemplo, é uma qualidade do nosso sistema. O primeiro passo para não reformar nada, você sabe, é querer reformar tudo. Como relator da reforma na Câmara dos Deputados, optei por priorizar alguns pontos e focar no que me parece mais essencial. Se o gênio de Aladim me concedesse um único desejo nesta reforma, pediria a aprovação do financiamento público exclusivo de campanha com forte restrição nos custos. Para que as disputas eleitorais voltem a ser baseadas em programas e não sejam apenas um festival de marketing.
CC: Por que é tão difícil aprovar uma -reforma política, mesmo nestes termos?
HF: Há duas causas essencialmente. Existem setores que se beneficiam do sistema atual, caríssimo e baseado no financiamento privado das campanhas. E existe um temor de parte dos parlamentares eleitos de fazer a mudança. Na sociedade há uma maioria expressiva que apoia a reforma. Pesquisas indicam que mais de 80% da população a querem.
CC: Mas esta mesma população rejeita a ideia do financiamento público exclusivo. Por que ele seria melhor do que o sistema atual?
HF: O sistema atual, de financiamento privado, tem levado a um encarecimento astronômico das campanhas. Em 2002, os custos de todas as campanhas foram de 827 milhões de reais. Em 2010, a soma atingiu 4,8 bilhões. O aumento foi de 591%. As eleições se transformaram em uma corrida do ouro na qual a capacidade de arrecadar vale mais do que o projeto que se defende ou a história e o currículo de quem concorre. Das 513 campanhas mais caras do País, 369 tiveram resultado positivo. Ou seja, os candidatos foram eleitos. Quanto mais cara a campanha, mais chances de ganhar nas urnas. O sistema privado tem um componente que traz enorme prejuízo à política: ele dá enorme poder aos -financiadores. Ao escolher este e não aquele “merecedor” de financiamento, eles limitam as opções eleitorais. Fazem a seleção. E os mesmos que financiam vão depois tratar com o governo de obras, compras estatais etc. Isso gera um mecanismo que fortalece os caminhos da corrupção. Óbvio que a corrupção é algo multifatorial, mas eu não tenho dúvida de que o financiamento público é uma das armas mais poderosas para combatê-la.
CC: Há quem diga que o PT abraçou a proposta do financiamento público para tentar apagar a imagem do chamado mensalão.
HF: É uma tese irônica. Infelizmente quase todos os partidos brasileiros enfrentaram problemas com financiamento de campanha. Precisamos nos dar conta, em nome do futuro do País-, da nossa democracia, de que a adoção do financiamento público dará mais autonomia aos governos eleitos e vai retirar boa parte da pressão que o poder econômico exerce hoje. Vai oxigenar a democracia, por permitir que milhares de brasileiros refratários a participar da política nela ingressem. Também acho que todo setor empresarial desejoso de vencer licitações com base na qualidade dos serviços oferecidos, no preço, na incorporação da tecnologia e da inovação vai aplaudir a mudança. Pois muitas vezes esses setores se sentem chantagea-dos a participar de um sistema de financiamento, legal ou não, para não ver comprometidas suas relações com futuros governos. Hoje os eleitores pagam caríssimo pelas campanhas, sem saber o quanto pagam e como pagam.
CC: Como é possível estabelecer o financiamento público em um sistema de voto nominal? Como seria feita a distribuição de recursos por candidato?
HF: Na última versão do relatório que apresentei, no fim de outubro, sugiro o sistema de votação apelidado de belga, mas que é adotado também na Holanda, Noruega, Suécia e Dinamarca. Os partidos organizam uma lista de candidatos. Mas atenção, ela não será feita pelos caciques. Terá de ser submetida a uma votação de todos os filiados. O eleitor vai continuar a votar da mesma maneira. Se ele quiser votar no partido, vota. Se quiser escolher o candidato, o faz. Há uma diferença, os partidos serão obrigados a se democratizar. A política brasileira padece de três problemas centrais: o abuso do poder econômico no processo democrático, a falta de democracia nos partidos e o personalismo.  Outro ponto do projeto é que ele amplia a possibilidade de participação direta da sociedade através das redes sociais. Atualmente, é muito difícil tramitar no Congresso um projeto de iniciativa popular. Eu sugeri um sistema no qual setores da sociedade, um único cidadão ou entidade, inclusive, poderão enviar sugestões. O tema será protocolado no Parlamento e ficará disponível no site por um tempo. Se a proposta obtiver 500 mil assinaturas digitais ou físicas ele passa a tramitar. Com um milhão, ganha regime de urgência. Abro também a possibilidade de emendas constitucionais de iniciativa popular, o que não é permitido hoje. Neste caso, o total de assinaturas necessárias sobe para 1,5 milhão.
CC: Enquanto os partidos de esquerda se fixam no financiamento público, aqueles de direita pregam o voto distrital. Qual a sua opinião?
HF: Sou crítico do voto distrital por diversas questões. Ele tende a concentrar o poder na mão de dois ou três partidos. Veja os Estados Unidos e o Reino Unido, dominados pelo bipartidarismo. Tem gente que defende esse sistema por achar que o PT sairia enfraquecido. É um engano. O PT é um dos grandes partidos do Brasil, tem 32% da preferência dos eleitores. Depois vem o PMDB, com 8%. Mas nem por isso vamos defendê-lo. Queremos um sistema capaz de aferir da melhor maneira a vontade da população. Outro problema do voto distrital é que ele joga fora muitos votos. Exemplo: em um distrito disputam cinco candidatos. Um faz 30%, o segundo faz 25%, o que fica em terceiro faz 20% e assim por diante. Alguém com 30% dos votos ganha o distrito todo. No sistema proporcional é diferente. Se 5 milhões de eleitores votarem num determinado estado, calcula-se o peso do voto desses eleitores e definem-se quantas vagas vão para cada partido. É muito mais plural, democrático. No distrital, o voto de opinião, de minorias, seria eliminado. O parlamentar viraria um defensor de temas paroquiais, locais. Seria avaliado pela quantidade de dinheiro que trouxer para uma ponte ou uma estrada.

Europa gravemente herida

Europa gravemente herida


El socialista Georgios Papandreou no quiso pasar a la historia de Grecia como el hombre que anuló la soberanía nacional para salvar a los banqueros y aceptó un estatus semicolonial para su país, con funcionarios extranjeros que controlarían su economía y su política. Para salvar su responsabilidad pidió un voto de confianza en el Parlamento y, sobre todo, convocó para diciembre un referéndum popular para que la ciudadanía decida si acepta o no el plan que, a costa de los griegos, permitiría a los grandes banqueros salir del brete donde se metieron. Después, tras perder su mayoría absoluta en el Parlamento y bajo presión franco-alemana, anuló el referéndum y tratará de formar un gobierno de unidad nacional con la derecha, aún más débil y desprestigiado que el actual. La Unión Europea (léase los capitales franco-alemanes y sus agentes gubernamentales), ante esa crisis, abandona a Grecia a su suerte (que la llevará, casi seguramente, a la cesación de pagos de la deuda, a la salida de la zona euro, la creación de una moneda propia y la devaluación de la misma -y, por consiguiente, de los ingresos de los griegos– y que podría llevarla, incluso, a una revolución).
Recordemos que Estados Unidos salvó a México, que tenía entonces menos de 100 millones de habitantes, con 55.000 millones de dólares durante la crisis llamada Tequila. Grecia, con cerca de 12 millones de habitantes, no pudo ser salvada ahora por una inyección de más de 200.000 millones de euros (280.000 millones de dólares). ¿Qué pasará entonces con países europeos grandes y poblados, como Italia y España, cuyas economías se tambalean y a los que los respectivos gobiernos aplican sangrías de caballo que las deprimen aún más? Si la Unión Europea no toma rápidamente grandes medidas preventivas, el derrumbe sucesivo de Italia, España y Portugal y el probable abandono del euro por los italianos, como prevé Paul Krugman, premio Nobel de Economía, podría resultar fatal.
Por eso la canciller alemana Angela Merkel sostiene ahora que lo esencial es salvar la zona euro, o sea, las finanzas europeas, porque la unión de Europa es en realidad no una unión de países y mucho menos aún de pueblos, sino una alianza conflictiva de capitales financieros. Ni siquiera es seguro que pueda lograrlo. Porque hasta ahora la Unión Europea perdió 280.000 millones de dólares, más otro tanto como resultado de la caída de las bolsas debido a la crisis griega. Y ni aún así pudo estabilizar a los bancos, que son insaciables y exigen continuas transferencias de los ingresos de la población hacia sus arcas. Aunque China, que es un gran socio comercial de la Unión Europea y tiene, por lo tanto, interés en que la misma se mantenga, acaba de ofrecer un refuerzo de 80.000 millones de euros (120.000 millones de dólares), ese aporte corre el riesgo de evaporarse como una gota de agua sobre una plancha caliente.
Además, para salvar la Unión Europea, el dúo Nicolas Sarkozy-Angela Merkel arrojan un salvavidas de plomo: el de la política recesiva y brutal de la reducción de los salarios indirectos (mediante cortes en educación, sanidad, asistencia social y aumentos en la edad de jubilación y de servicios e impuestos) e incluso de los salarios directos mientras el capital financiero especula con los precios de las materias primas agrícolas. El poder adquisitivo de los consumidores –y su expectativa de consumo– van hacia abajo mientras el costo de la alimentación y de los servicios aumentan. El resultado es un menor consumo interno en Europa en el momento en que la misma deberá pagar el sostén chino con concesiones políticas –como el reconocimiento de que China es una economía de mercado, tal como exige Pekín– lo cual facilitará grandemente las exportaciones chinas a la Unión Europea.
Hasta ahora, salvo en Grecia, donde las luchas son cada vez más masivas y decididas y podrían desembocar en un estallido social, los gobiernos europeos no deben enfrentar una oposición social masiva. A lo sumo ven crecer la oposición que a veces es de centro izquierda –como los social-liberales en Italia o los socialdemócratas en Francia– y otras de derecha, pero que en ninguno de los dos casos tiene otra propuesta económica que el continuismo de los planes del capital, apenas reformados y, por supuesto, ni piensa en una alternativa social. Si la crisis económica es profunda y gravísima, Europa políticamente es conservadora y socialmente recién comienza a despertar con algunas huelgas y movilizaciones y con el movimiento de los indignados.
Por consiguiente, y ante la falta de una amenaza social al poder capitalista, en el Grupo de los 20 se aprobarán medidas que aumentarán el nivel de los sacrificios que deberán hacer los trabajadores europeos, divididos aún horizontalmente entre nativos e inmigrantes y verticalmente por la competencia entre los que piensan sólo en su región o en su país sin percibir la necesidad de encontrar una solución común anticapitalista y de imponerla colectivamente. El cada uno para sí, el localismo, el nacionalismo, el racismo, el chovinismo que afectan a vastos sectores de los trabajadores europeos, son los principales sostenes de un capitalismo en crisis pero que conserva todavía la hegemonía cultural e ideológica y puede, por lo tanto, dominar a sus víctimas desunidas.
No basta pues con condenar al capitalismo como lo hacen los indignados, o con resistir con huelgas sus políticas y medidas como lo hacen algunos sindicatos. Es indispensable además organizar en toda Europa por sobre las fronteras y uniendo inmigrantes y nativos, con un programa anticapitalista alternativo de expropiación del capital financiero, de modificación radical del sistema impositivo, de sostén de los consumos populares y planificación común del desarrollo industrial. Este programa debe partir de que la crisis la deben pagar los que la causaron, de que los salarios y condiciones de vida son intangibles, de que al internacionalismo de las finanzas y las trasnacionales hay que oponerle el internacionalismo de los productores.
Fuente: http://www.jornada.unam.mx/2011/11/06/opinion/016a2pol